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«It is said that exploitation must end in the world. It is known that exploitation increases, extends, prospers and becomes ever more ruthless in defence of its right to exploit»
John Berger, 1968, in Understanding a Photograph
As nossas canetas russas escrevem a traços largos. Temos sofrido enormemente e disso quase nada foi escrito. Mas para os autores ocidentais, com a sua preocupação de examinar à lupa as células do organismo, agitando a ampola farmacêutica sob a luz dos projectores, isto é uma verdadeira epopeia, que permitirá acrescentar dez tomos à Procura do Tempo Perdido, descrevendo o pânico do espírito humano quando numa cela há uma sobrelotação vinte vezes superior à prevista, e não há baldes, só sendo permitido ir à latrina uma vez por dia!
(Alexandre Soljenitsine, “Arquipélago de Gulag”, Vol I)
A vida não é isso. A vida não é nobre nem grave. (…) Nada é fatal. A vida tem surpresas. É absurda. E por ser absurda há sempre esperança.
(in O Cônsul Honorário, Graham Greene)
Argos, de olhos postos nos céus, gemia; pela cara abaixo rolavam-lhe caudais não só de água, mas também (como vim a saber depois) de lágrimas. «Argos», gritei-lhe, «Argos!».
Então, com mansa admiração, como se acabasse de descobrir uma coisa perdida e esquecida há muito tempo, Argos balbuciou estas palavras: «Argos, cão de Ulisses.» E a seguir, também sem me olhar: «Esse cão atirado para o esterco.»
Nós aceitamos facilmente a realidade, talvez por intuirmos que nada é real. Perguntei-lhe o que conhecia da Odisseia. A prática do grego era-lhe penosa. Tive de repetir a pergunta.
«Pouquíssimo», disse ele. «Menos que o mais pobre dos rapsodos. Já deverão ter passado mil e cem anos desde que a inventei.»
(Excerto de O Imortal, in O Aleph, Jorge Luis Borges)